"Do PVC ao Amor"
E o garoto esperto aqui do lado
de onde trabalho arrumou uma solução interessante para saciar suas necessidades
completamente justificáveis. É que aqui do lado tem um pé de cajá, que quando
ta na época de “dar” fica a coisa mais linda do mundo, extremamente
convidativa, toda pintada de verde e amarelo. Porem guarda com ele alguns
problemas a serem solucionados antes do deleite, algo como os enigmas da
esfinge ou coisa parecida. Ele é alto, muito alto, não dá pra como o desejo
pede, apenas estender a mão e saborear daquele delicioso fruto, é preciso algo
mais, um instrumento que ajude nisso, e assim são os instrumentos, como me
ensinou o poeta, pontes entre o desejo e o prazer.
Mas ele, o menino, “ligado todo”
como se diz por aqui, fácil e rapidamente arranjou uma solução, com um cano de
PVC “cutucava” o fruto que soltava e escorregava direto para sua mão, que por
sua vez, como prestativo instrumento que é, levava a boca, e assim então, o
prazer...
O cano de PVC é um instrumento.
Usado para passar água, mas, na imaginação e criatividade daquela criança foi
muito mais, foi usado pra saciar a vontade, mais que matar a fome, foi
utilizado pra realizar seu sonho mais desejado naquela hora, era instrumento de
prazer...
O corpo também é um instrumento,
mãos pegam, pernas andam, boca come, se reproduz, até a bíblia me confirma isso
em Genesis 1:27:
“E criou
Deus o homem à sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.
E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a... “
(Gênesis 1:27-28).
E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a... “
(Gênesis 1:27-28).
Mas também o corpo é um instrumento sagrado de
realização dos desejos, dos sonhos, aliás, como falei, são assim todos os
instrumentos, pontes entre sonhos e realizações, entre desejos e prazer... e no
final do capítulo do mito cosmogônico Javé fala:
“E viu Deus tudo quanto
tinha feito, e eis que era muito bom.”
(Gênesis 1:31)
(Gênesis 1:31)
E no mesmo livro sagrado ele nos ensina isso,
nossos corpos são também instrumentos de fruição, gozo, prazer, a mesma boca
que come, clama por beijos nos Cânticos de Salomão:
“Beije-me ele com os beijos da sua boca; porque melhor é o teu amor do
que o vinho.”
(Cânticos 1:2)
(Cânticos 1:2)
ou até ousa mais quando diz:
“Qual
a macieira entre as árvores do bosque, tal é o meu amado entre os filhos;
desejo muito a sua sombra, e debaixo dela me assento; e o seu fruto é doce ao
meu paladar.”
(Cânticos 2:3)
e ainda
“Favos de mel manam dos teus lábios,
minha esposa! Mel e leite estão debaixo da tua língua...”
(Cânticos 4:11).
O corpo é um instrumento de deleite, prazer, assim
me ensina o poema sagrado...
Mas não pensam assim os teólogos tradicionais. O
corpo é um instrumento de trabalho, nada mais. O PVC deve ser usado para passar
água e nada mais. O prazer é pecado. Deus é sádico e tristeza é sinônimo de redenção.
Sou teólogo diferente, gosto dos olhos para ler
poesia, gosto de meus braços para o abraço, gosto da boca para o beijo, sou
criança/filho de Deus, brincando com o presente que ele me deu. Corpo é presente
de Deus. Prazer é presente de Deus, porque tudo o que é belo vem de Deus, e
Deus é amor, seja ele negro ou branco, casado no papel ou não, homem ou mulher,
homo ou hétero.
No mesmo PVC passa água e cajá.
Clarence Santos
"Livremente inspirado no Rubem Alves e no moleque que até hoje vive pelo mosteiro de São Bento em Olinda atrás de cajás e mangas..."